Associação Brasileira de Patologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia
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Adenocarcinoma cervical – Adenocarcinoma in situ, displasia glandular e adenocarcinoma invasivo inicial da cérvice uterina

Zaino RJ. Symposium part I: adenocarcinoma in situ, glandular dysplasia, and early invasive adenocarcinoma of the uterine cervix. Int J Gynecol Pathol. 2002 Oct;21(4):314-26.

Enquanto a incidência do câncer escamoso do colo uterino tem diminuído, observa-se aumento tanto relativo quanto absoluto do adenocarcinoma da cérvice uterina nas últimas três décadas. A criação e uso de instrumentos de amostragem endocervical tem mostrado a necessidade de refinamento dos critérios patológicos para lesões glandulares precursoras e invasoras iniciais bem como de seu comportamento biológico. Este artigo revisa os aspectos mais importantes desta entidade.

Classificação histológica e comportamento do adenocarcinoma in situ

AIS foi primeiramente descrito por Fridell e McKAy em 1953. Uma variedade de subtipos de AIS tem sido descrito em função das características citoplasmáticas, incluindo endocervical, intestinal, endometrióide e adenoescamoso misto. Apesar de nenhum significado bilógico ter sido associado a estes diferentes tipos celulares, a subdivisão auxilia os patologistas no reconhecimento dos vários tipos morfológicos. Coexistência de neoplasia intra-epitelial cervical é observada em 50% dos casos de AIS. Geralmente, o AIS envolve a superfície epitelial e a superfície das glândulas próximo a zona de transformação, áreas acessíveis a amostragem celular pela escova endocervical. A terapia definitiva para AIS permanece a histerectomia, sendo possível a conização em pacientes selecionadas. Deve-se dar preferência a conização por bisturi devido a necessidade de retirar toda a zona de transformação e canal endocervical.

Evidências suportam o AIS como lesão precursora do adenocarcinoma invasivo:

1-AIS é diagnosticado em populações 10 a 20 anos mais jovens do que aquelas com adenocarcinoma invasivo

2-AIS é freqüentemente observado adjacente ao adenocarcinoma invasor

3-os mesmos tipos de HPV são vistos no AIS e no adenocarcinoma invasivo. Técnicas de hibridização in situ ou PCR (reação de cadeia de polimerase) observam HPV em 40 a 90% dos casos de AIS, usualmente HPV 18 e menos freqüentemente HPV 16, os mesmos tipos encontrados no adenocarcinoma invasivo.

4-progressão de casos de AIS não tratados para adenocarcinoma invasivo

Classificação histológica e comportamento da displasia glandular

Assim como sua contraparte escamosa, as lesões glandulares intra-epiteliais da cérvice possuem um espectro morfológico que varia de alterações muito leves até anomalias graves, porém elas ainda não foram bem estudadas e não se correlacionam com a parte clínica. A classificação da OMS para tumores da cérvice inclui atipia glandular, displasia glandular (hiperplasia atípica) e AIS. Até que estudos definam melhor o potencial de progressão e a correlação clínica da atipia e displasia glandular, deve-se considerar AIS como a única lesão que tem potencial de progressão invasivo.

Distinção do adenocarcinoma invasor do in situ

Na histologia, em 20% dos casos não é possível distinguir AIS de adenocarcinoma invasivo inicial.

Definições e comportamento biológico do adenocarcinoma microinvasivo

Não existe consenso sobre os critérios para o diagnóstico de adenocarcinoma microinvasivo da cérvice. Alguns autores consideram menor de 5 mm de profundidade, enquanto outros definem como menor de 3 mm ou ainda menor de 1 mm. De acordo com a Sociedade dos Oncologistas Ginecologistas, a definição de adenocarcinoma microinvasivo é células neoplásicas que invadem o estroma em um ou mais locais na profundidade de até 3 mm, na ausência de invasão linfática e sangüínea. A FIGO divide os tumores Ia em duas categorias: Ia1 (lesão não maior que 3 mm de profundidade e não que 7 mm de extensão) e Ia2 (lesão > 3 mm e não maior que 5 mm de profundidade e não que 7 mm de extensão). A presença de invasão vascular ou linfática não altera o estadiamento. Alguns autores têm sugerido que mulheres jovens fortemente desejosas de gestação e com estádio Ia1 possam ser tratadas apenas com cone-biópsia.

Baseado na literatura existente, pode-se afirmar que:

O adenocarcinoma in situ (AIS) é lesão precursora do adenocarcinoma invasivo e pode ser dividido em subtipos histológicos distintos;
O AIS é multifocal, envolvendo múltiplos quadrantes da cérvice em aproximadamente metade dos casos;
O AIS pode ser erradicado pela histerectomia e em muitos casos pode ser tratado eficazmente pelo cone-biópsia;
A displasia glandular endocervical não é lesão reproduzível, seu comportamento e existência são ainda indefinidos;
Existem critérios que permitem distinguir o adenocarcinoma invasivo inicial do AIS em aproximadamente 80% dos casos;
O adenocarcinoma microinvasivo da cérvice possui várias definições clínicas. A decisão clínica deve se orientar pela descrição da profundidade, extensão e presença de invasão vascular e linfática.